Nos termos do CDC, é qualquer cobrança indevida que gera o direito à repetição em dobro do que foi cobrado? Nosso comentário no CBN Madrugada
Evidentemente que não. A propósito, vale a pena transcrever o que enuncia o parágrafo único do art. 42, para que possamos divagar a posteriori sobre alcance e aplicação da norma, in verbis:
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
A redação é, como se vê, clara e auto-explicativa. Nota-se que não basta apenas a ocorrência da cobrança indevida por parte do fornecedor para que venha a existir o direito à repetição do indébito, é necessário, também e indispensavelmente, o pagamento indevido pelo consumidor.
Assim, a devolução em dobro verifica-se somente quando há a soma de dois requisitos imprescindíveis, quais sejam: a) a existência de cobrança indevida e b) o pagamento em excesso pelo consumidor do valor indevidamente cobrado.
Exemplifico, para uma melhor assimilação: suponha-se que uma Companhia Estadual de Saneamento envie ao cliente/consumidor uma fatura relativa aos serviços de esgotamento sanitário e abastecimento de água, cobrando o valor de R$ 200,00 (duzentos reais), quando, na realidade, o valor cobrado deveria ser o de R$ 50,00 (cinqüenta reais). Desapercebido, o consumidor vai e efetua o pagamento da fatura. Posteriormente, nota o erro e ingressa no judiciário requerendo a repetição do indébito do que foi pago indevidamente. Diante disso, terá direito a receber o valor de quanto? Simplesmente, o dobro do que pagou em excesso, ou seja, se pagou indevidamente R$ 150,00 (cento e cinqüenta reais), terá direito ao montante de R$ 300,00 (trezentos reais).
Há que se ressalvar, entretanto, que nem sempre a fórmula mágica "cobrança indevida + pagamento em excesso pelo consumidor do valor indevidamente cobrado" gerará o direito de ser indenizado em dobro. É preciso levar em consideração a circunstância do "engano justificável".
Mas, como se aferir a existência de engano justificável? Com a palavra, o Prof. Leonardo de Medeiros Garcia:
Para aferição do "engano justificável" é preciso analisar se não houve culpa por parte do fornecedor. Se ele provar que não houve negligência, imprudência ou imperícia de sua parte, ficará isento de indenizar o consumidor pelo dobro da quantia cobrada. (GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito do Consumidor. Código Comentado e Jurisprudência. 5ª ed. Niterói, RJ: Impetus, 2009. p. 260.)
Desse modo, é preciso estar atento para o fato de que não basta apenas o pagamento em excesso aliado à cobrança indevida, para que seja dado ao consumidor o direito da devolução em dobro. Além desses dois requisitos, o aplicador da norma deverá observar a ocorrência, ou não, da hipótese de engano justificável. No caso de existir, o consumidor receberá tão-somente a quantia paga em excesso; e, na hipótese, de inexistência de engano justificável a indenização em dobro se fará necessária.
De mais a mais, pertinente se torna frisar que o Superior Tribunal de Justiça – STJ já se pronunciou no sentido de que "a só remessa de carta de cobrança ao consumidor não preenche o suporte do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor; diversamente do art. 1531 do Código Civil, para o qual é suficiente a simples demanda, o Código de Defesa do Consumidor apenas autoriza a repetição se o consumidor tiver efetivamente pago o indébito". (STJ, REsp. nº 539.238/RJ, Relator Min. Ari Pargendler, DJ. 29.03.2004.)
Por fim, é importante esclarecer, ainda, que a aplicação do parágrafo único do art. 42 do CDC se dá apenas na seara extrajudicial de cobrança de dívida.
Aderei o comentário. Tirou minha dúvida!
ResponderExcluirMuito bem explicado. Parabéns!
ResponderExcluirQuem bom terem chegado num consenso!
ResponderExcluirCorretamente! Deve ser levado em conta a vulnerabilidade.
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